ALÉM DA VIDA: ENTREVISTA COM MATT DAMON


Para Damon, o diretor é rápido com a câmera, escolhe bons projetos e vive em paz consigo mesmo

QUEM É

Nasceu em Boston, nos Estados Unidos, em 8 de outubro de 1970. Foi indicado a três Oscars: Melhor Ator e Melhor Roteirista por Gênio indomável, em 1997 (venceu o segundo), e Melhor Ator Coadjuvante por Invictus, de Clint Eastwood, em 2009. É um dos atores que mais apoiam causas humanitárias internacionais

O QUE FEZ

O homem que fazia chover (1997), O resgate do soldado Ryan (1998), O talentoso Ripley (1999), A identidade Bourne (2002) e Os infiltrados (2006)

Nem mesmo Leonardo Dicaprio, o mais celebrado da nova geração de atores de Hollywood, consegue se equiparar a Matt Damon na atuação com grandes diretores. Nos últimos 12 anos, Damon trabalhou com a Santíssima Trindade do cinema americano – Steven Spielberg, Francis Ford Coppola e Martin Scorsese. Ele também fez parcerias com independentes badalados como Steven Soderbergh, Gus Van Sant e Paul Greengrass. Juntam-se a essa lista os irmãos Coen e Clint Eastwood, com quem trabalha pela segunda vez – e por quem revela uma admiração profissional e pessoal. Aos 40 anos, Damon diz levar uma vida simples em Nova York com a mulher e as três filhas.

Inicialmente você recusou o convite para participar de Além da vida. Por quê?
Matt Damon – Apenas porque estava atrelado a outro projeto (Os agentes do destino) e as filmagens das duas produções ficariam muito próximas uma da outra. Mandei um e-mail para o Clint sugerindo o nome de alguns atores (Josh Brolin e Christian Bale, entre eles) . Clint entrou em contato novamente e disse que não faria o filme com outro ator e que tinha uma solução: filmaria todas as cenas dos gêmeos em Londres e do tsunami no Havaí, deixando para filmar comigo o restante da produção dois meses depois na cidade de São Francisco.

Como é o estilo dele como cineasta?
Clint é decidido e econômico. Ele sabe exatamente o que quer de cada cena e costuma aprontá-las em dois, três takes. Ele é rápido. Clint também tem outra missão: ele gosta de terminar as filmagens num horário razoável para voltar para casa e jantar com a família. Às vezes, fica impaciente quando a gente atrasa o cronograma dele (risos) .

Como foi sua pesquisa para interpretar o personagem?
Procuro sempre estudar a fundo o tema de meus filmes. Clint, porém, pediu para eu não mergulhar muito na tecnicalidade, no fato de tentar entender a clarividência, a mediunidade. Li um ou dois livros sobre o tema por pura curiosidade. Mas Clint e eu vimos o personagem de maneira muito parecida: o importante seria mergulhar e tornar crível a solidão dele e o fato de que o personagem não quer ser sozinho na vida.

De Francis Ford Coppola a Steven Spielberg, você tem trabalhado com grandes diretores. É possível comparar o estilo deles?
Só se for para dizer que cada um deles tem uma técnica completamente diferente do outro. Em 2010 trabalhei com três grandes diretores: Steven Soderbergh, os irmãos Ethan e Joel Coen e com Clint. Soderbergh difere de Clint, pois ele é muito interessado em tecnologia, em como as câmeras estão ficando mais compactas. Em se tratando de ter uma visão completa sobre um filme, não existe ninguém em atividade como os irmãos Coen. Eles lhe entregam um livro com todos os desenhos de cenas do filme, mostrando como você vai aparecer em cena e como as câmeras vão se movimentar nelas. E, quando você chega para filmar, eles ainda estão abertos a sugestões. Com os irmãos Coen é difícil ficar ansioso.

Você sente muita ansiedade durante as gravações?
O tempo todo. Filmes são dispendiosos, há muita grana em jogo. Imagine um de US$ 100 milhões, com 100 dias de filmagens. Faça as contas... Em O ultimato Bourne, gastamos mais de US$ 500 mil por dia para filmar dentro da estação de Waterloo, em Londres. Se você chega a um set desses e alguma coisa dá errado, começa a escutar o som da maquininha contando os dólares desperdiçados. É muita pressão, principalmente quando o filme é sustentado pelo nome de um ator.

“Clint já passou por momentos em que não era considerado ‘cool’ pela imprensa. Nunca deu bola para a percepção que Hollywood tinha da imagem dele”

Existe pressão também para escolher os projetos certos?
Aprendi em minhas conversas com pessoas que respeito na indústria do cinema que, quando um ator ou diretor começa a se preocupar com o desaquecimento da carreira dele, essa é basicamente sua sentença de morte. A partir daí surgem escolhas por projetos que são menos arriscados, com fórmulas prontas. Ninguém consegue se manter no topo por muito tempo. Vai chegar um momento em que você vai fazer filmes que importam menos. E aí você se pega com dois caminhos a seguir: ou vai fazer o máximo de filmes possíveis para encher o bolso de grana, criando uma crise de identidade e uma imagem que foge a seu controle, ou vai fazer como o Clint: escolher projetos de que gosta. Ele tem um grande modelo de carreira a ser seguido, além de ser um sujeito feliz e em paz consigo mesmo. Clint já passou por momentos em que não era considerado “cool” pela imprensa, ou não estava no gosto popular. Nunca deu bola para a percepção que Hollywood tinha da imagem dele.

Você tem planos de dirigir?
Sim, e tem sido uma procura muito lenta pelo projeto certo. Obviamente não quero que meu primeiro filme seja uma droga (risos) .

Em 2010 você atuou em Zona verde, um filme que debate a invasão americana ao Iraque. Qual é sua opinião sobre o site WikiLeaks, que tornou público um imenso dossiê sobre a guerra?
Sou a favor de que as pessoas tenham o maior nível de acesso possível de informações sobre nossos governos. Quando governos começam a fazer as coisas em segredo, se metem em grandes apuros.

Você foi um dos artistas que mais apoiaram a campanha de Barack Obama para presidente. Como avalia seu governo?
Como muitos dos eleitores que o apoiaram desde o início, sinto um grande descontentamento com a gestão dele. Ele decidiu intervir em Wall Street, mas os bancos hoje ganham mais dinheiro que antes. A taxa de desemprego na casa dos 10% é terrível. É como eu pegar minhas filhas e ir para uma loja de doces. Elas vão me convencer de que precisamos de chocolates, balas de menta, caramelo e sorvetes. Aí eu chego em casa e digo para minha mulher: “Querida, acho que errei feio hoje. Fiz muitas concessões”. Obama fez isso para ter chances de ganhar as próximas eleições. Ele não quis lutar contra os republicanos e ignorou uma parte da população que estava disposta a apoiá-lo em um debate nacional.

Qual foi a pior concessão do governo dele?
O corte de impostos criado pela gestão Bush, ao qual Obama se opôs quando candidato. O recente acordo de Obama com os republicanos para estender o corte de impostos em um esforço para gerar novos empregos é de lascar. Eu me beneficiei desse corte. Você acha que eu vou pegar esses 3% de abatimento sobre meu salário e criar um empreendimento? Claro que não. Os ricos vão depositar o dinheiro no banco. Essa é a mentalidade dos privilegiados deste país. Não acho saudável. Uma classe média forte é a base para uma economia robusta. Com essa redução, elevamos o endividamento do país e alargamos ainda mais o fosso entre ricos e pobres. Não é o país que quero que minhas filhas herdem.

LEIA TAMBÉM

Postar um comentário

0 Comentários